segunda-feira, 1 de julho de 2013

Entrevista com o diretor de teatro José Luiz Ribeiro parte II

Zé Luis: e eu fiquei numa dúvida não sei se por covardia ou qualquer coisa. As pessoas me perguntam muito “ por que você ficou em Juiz de Fora?”. Por causa de uma romanzeira, por causa de uma ameixeira. As pessoas ficam assustadas, mas é minha casa e o meu coração que estão plantados nessa cidade. Eu acho que se talvez eu tivesse ido não teria feito o trabalho que fiz nesses quarenta e sete anos de divulgação. Muita luta, muita luta mesmo. A gente teve muita oposição . A outra chamada para sair foi quando o pessoal do Porto me chamou para dirigir lá em Portugal e acabei não indo. Fui a Belo Horizonte dirigir, fui ao Rio, mas sempre voltando, meu pé sempre fincado aqui.

Daniela Aragão: Há um potencial criativo imenso em Juiz de Fora, músicos maravilhosos.

Zé Luis: No campo da música isso aqui é um jardim muito florido. A gente tem uma quantidade de coisa para ser feita. Todos os professores e funcionários da universidade recebem convite para irem as peças do Divulgação. Temos uma resposta de apenas 5% de professores da universidade que vão. Se o professor não vai isso repercute, pois antigamente o professor vinha e divulgava os espetáculos com os alunos nas salas de aula, isso gerava uma ampliação considerável do público. Perdeu-se a estrutura cultural que tínhamos antes.

Daniela Aragão: Eu acho que nos anos sessenta, época de Sueli Costa, João Medeiros, você, Bracher, Dnar Rocha, Rui Merheb entre outros havia mais uma união entre as categorias artísticas. Hoje está tudo dissociado, segmentado. A literatura está aqui, a música ali, o cinema lá.

Zé Luis: Acontece o seguinte, artes plásticas é uma arte solitária, então qualquer botequim resolveu ser galeria. Então quando tínhamos a Galeria de Arte Celina ia todo mundo para ver uma exposição, era um ponto de encontro de intelectuais. Fizemos lá o Romanceiro da Inconfidência. Naqueles anos sessenta, momento de ditadura e tudo havia uma força muito grande, os estudantes de medicina faziam filmes tipo O encouraçado Potemkin. A medicina se preocupava com a cultura, o que acontece hoje com o estudante de comunicação? No primeiro período que entra ele não tem nem a Teoria da Comunicação, mas quer fazer estágio na produtora, quer pegar uma máquina e sair filmando independente de conhecer as pessoas ou saber de fato o que vai fazer. Agora fizeram um trabalho sobre teatro em Juiz de Fora e os meninos vieram dizendo “Começou com Natálio Luz?”, não eu disse, muito mais para trás, 1850, o teatrinho da misericórdia. Nós estamos morrendo, o doutor Wilson de Lima Bastos foi embora e as pessoas nem estão notando o trabalho que esse homem fez para deixar a história de Juiz de Fora organizada.

Daniela Aragão: Acho que essa questão da dissociação entre as artes como falei um pouco antes é sintomática e geral.

Zé Luis: Com certeza. Tudo se profissionalizou, havia uma certa forma de amadorismo que era anárquico e as pessoas conseguiram. Hoje praticamente se vive de lei e para se conseguir uma coisa na lei é um percurso complicado. Deveria ter um canal para você desenvolver, ora você já chegou num estágio que não precisa ser pré julgada para isso, eu penso. Por exemplo, eu com 50 anos de teatro quando tenho que entrar devo me organizar como um grupo que está começando agora. Esse nivelamento eliminou o mérito. Outro problema é a religião, não se pode ter essa intolerância, está na hora de rever Griffith. A gente está chegando num ponto de não suportar mais o caminho da intolerância. Agora como que a música atua e salva nisso? Salva no sentimento da gente, um sentimento individual. Costumo dizer que quando estou no palco sou professor, quando estou escrevendo sou jornalista. É triste, mas as pessoas estão caminhando para um individualismo total. Hoje não se faz mais arte num sentido geral, faz-se arte para um tipo de coisa, arte para público gay, para negros, uma coisa terrível.

Daniela Aragão: Segmentação por gêneros então?

Zé Luis: Exatamente. Daqui a pouco a música entra nisso.

Daniela Aragão: Assisti a um monólogo com a Zezé Polessa chamado “Não sou feliz mas tenho marido”. Gostei muito, o timing da atriz era ótimo e tal, mas percebi que o discurso era todo voltado para o público burguês Rio de Janeiro Zona Sul, eu assisti ao espetáculo justamente no teatro da Gávea. A universalidade vai se perdendo.

Zé Luis: Exatamente porque a própria escola está tirando disciplinas fundamentais da grade curricular. O curso de Comunicação por exemplo tirou todas as literaturas, como é que jornalista vai escrever bem se não lê? Está tudo na máquina, como se faz blog e isso e aquilo. Estamos nesse tipo de complicação, a pessoa não está preparada.

Daniela Aragão: Você está fazendo um livro sobre sua trajetória no teatro. Gostaria de saber se você tem um grande sonho em relação ao teatro ainda não realizado.

Zé Luis: O teatro nunca te realiza, você sempre tem o que eu costumo dizer quatrocentos olhos, que é a lotação aqui. Tem coisas que eu adoraria fazer como “O homem de La mancha”, “A morte do caixeiro viajante” também. Estou me afastando cada vez mais como ator e fico mais diretor, o que eu mais gosto de fazer em teatro depois da iluminação, que é meu sentimento frustrado de cineasta, é teatro infantil. Adoro fazer ator para criança, a última vez que fiz foi em 1990 e tenho uma saudade enorme. É difícil dirigir e atuar no espetáculo infantil, no adulto é mais fácil.

Daniela Aragão: Tem algum compositor que você gostaria de trabalhar, por exemplo o Edu Lobo fez trilhas para ballet, teatro.

Zé Luis: O Chico Buarque por exemplo na Ópera do malandro, o uso da palavra que ele faz, o vernáculo. A música do Edu é um negócio fascinante para mim, Milton Nascimento me fala muito, Caetano, acho que são os quatro cavaleiros do apocalipse. Tem arranjadores que são fabulosos, acho que sonho a gente tem muito. O Chico Buarque trabalha maravilhosamente com a teatralidade pois ele é da literatura. Tem outros que a gente esquece e que são fantásticos como Aldir Blanc.

Daniela Aragão: Você está aposentando da universidade e continua trabalhando com a pós graduação.


Zé Luis: Eu estou trabalhando muito, o mesmo que eu trabalhava e mais um pouco pois foram aparecendo coisas extras e tal. O teatro eu não vou parar e música também não.

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